O que está por trás da autoimagem idealizada?



Sempre fui uma pessoa vaidosa, cuja autoimagem idealizada se sustenta sobre beleza, elegância, alinhamento e destaque pela minha apresentação pessoal. Não sei exatamente com quem aprendi esse senso estético, mas, intuitivamente, sempre soube combinar cores, texturas, distribuir volumes e escolher minhas roupas de acordo com a ocasião e o ambiente.

Quando criança, sofria por não ter dinheiro para investir em boas peças ou ter variedade. Essa situação se tornou ainda mais crítica na adolescência, quando a aparência passou a ter um peso maior com o início dos jogos de sedução e os primeiros interesses românticos. Queria impressionar, mas não tinha acesso às roupas da moda, às cores do verão, aos acessórios desejados. Foi angustiante. Para contornar isso, eu me virava com o que tinha: transformava roupas do meu pai, adaptava qualquer peça que caísse em minhas mãos e pegava emprestado de amigas sempre que podia. Lembro da sensação única de vestir algo novo, algo que nunca poderia comprar.

Os anos passaram, e na vida adulta, com independência financeira, pude finalmente escolher minhas próprias peças, sem a pressão da falta de dinheiro. Curiosamente, nunca fui consumista, mas sempre valorizei qualidade e alinhamento. Meu estilo tende ao sóbrio e clássico, com algumas peças alternativas. Prefiro cabelo bem cortado, maquiagem discreta, bolsas elegantes e sapatos confortáveis. Nunca investi em grifes caríssimas, mas sempre desejei algumas marcas. Um limite real para mim sempre foi meu porte físico: sou baixa, 1,54m, e nunca pesei mais de 50kg. Hoje, tenho pouco mais de 46kg.

Ao longo da vida, fui vista como uma pessoa elegante. Meu modo de me vestir, minha forma de falar e meus itens pessoais sempre refletiram essa identidade. Essa autoimagem foi um pilar para mim. No entanto, após anos dedicados à meditação e ao autoconhecimento, comecei a observar, de forma mais atenta, minha relação com minha aparência e apresentação pessoal.

O quanto essa identidade é, na verdade, uma prisão? O quanto nos limitamos ao que vestimos, ao que escolhemos exibir ao mundo? Esse questionamento não surgiu agora; ele vem se construindo há anos, ainda que, a princípio, de maneira sutil e quase imperceptível. Hoje, percebo com mais clareza minhas intenções e emoções ligadas à forma como me visto. Quantas vezes desejei me sentir especial, destacar-me, demonstrar poder? Quantas vezes minha escolha de vestimenta carregou a necessidade de estar acima dos outros? O que está por trás disso tudo? Talvez a busca por amor, reconhecimento, a tentativa de mitigar inseguranças ou uma autoestima fragilizada.

Muitas vezes, fiz compras movida por uma necessidade de mudança interna que eu não conseguia operar na minha vida. Um vestido novo, um acessório diferente, uma peça que me trouxesse um frisson momentâneo, algo que dependesse apenas de mim e da minha carteira. Com o tempo, percebi o cansaço desse ciclo. Também compreendi como o sistema se beneficia dessa ilusão: um ciclo vicioso que nunca se encerra.

Quando comecei a questionar se poderia sair desse padrão, senti medo. O medo de não me reconhecer, de perder algo essencial em mim. Nos meus retiros de silêncio, ouvia falar sobre a iniciação dos monges budistas, que raspam a cabeça e não usam adornos, perfumes ou qualquer elemento que os diferencie. Apenas imaginar essa ideia era desesperador para mim. Ainda assim, o desapego exercia um certo fascínio.

Depois de anos refletindo, e também sentindo exaustão com a luta para manter uma autoimagem idealizada, decidi me propor a um desafio: um ano sem compras relacionadas a vestuário, exceto em caso de necessidade real. Estou segura e, ao mesmo tempo, insegura. Mas essa é a verdadeira riqueza: reconhecer minha ambivalência, minha humanidade e seguir questionando quem eu sou para além da imagem que construí.

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